Há já muito tempo que é evidente a Grécia ser uma espécie de "tubo de ensaio" europeu para o futuro da União, aquilo que parece não ter sido devidamente acautelado pelos magos do laboratório, mais parecem aprendizes de feiticeiro, é que o dito podia explodir-lhes nas mãos e provocar estragos a toda a volta e em todos.
Durante várias décadas foi-se vivendo um idílio onde o chamado eixo franco-alemão, ainda antes e depois da queda do muro de Berlim, funcionou como uma espécie de tias ricas, muito bem formadas, plenas de boas intenções, que tinham como principal objetivo abrigar sob as suas formosas e potentes asas, os parentes mais pobres da família. A ideia, diziam, não era dar-lhes uma boa mesada e deixá-los levar boa vida, nada disso, faziam questão de ensinar a pescar e não dar o peixe. Acontece porém que uma das tias, a dado momento, teve que meter dentro de portas um parente havia muito dali afastado, e então a outra, para aceitar colaborar nas despesas inerentes e a acrescer ao cumprimento do sonho de erradicar a pobreza de toda a família, fê-la prometer abdicar de certos luxos a favor do almejado bem comum. Ou seja, aquando da reunificação da Alemanha esta teve que desistir da sua moeda, o marco indigena, por troca pelo euro de todos. Durante os primeiros tempos, enquanto toda aquela gente ainda estava imbuída da melhor das boas vontades, na verdade muito mais fruto do receio do não conhecimento comum do que por outra coisa qualquer, ainda a coisa foi funcionando com alguma harmonia, simplesmente o tempo não pára. As titis morreram e vieram os seus sucessores, muito mais pragmáticos e sobretudo completamente isentos de qualquer réstia do sonho que movia as saudosas tias, nascido dos horrores a que aquelas tinham assistido e sentido na pele, mas antes beneficiários de uma existência rodeada de sucesso consubstânciado pelo conforto e pelo poder. Entretanto os parentes pobres e os seus descendentes, que inicialmente pareciam bem encaminhados e a gastar adequadamente o dinheiro tão magnânimamente cedido, desataram a fazer asneiras, a ceder aos seus verdadeiros impulsos, acusaram os primos ricos, e a estourar a massa em tudo menos naquilo que era suposto. Foi ao longo deste processo que os herdeiros das duas primordiais tias ricas começaram a ter as primeiras desavenças, especialmente na forma como, e mesmo se, deveriam continuar a ajudar, ou não, os pobretanas e preguiçosos gastadores, e então, os desde sempre mais ricos deles, ultrapassada a tal fase periclitante de sustentar o parente que quiseram recuperar lá para casa, começaram a perceber o erro que fora abandonar a sua maior força, a sua antiga moeda, o marco. E agora? Só tinham uma solução, transformar o euro nisso mesmo.
Desde então, mais, ou menos evidentemente, o que tem acontecido é a França tentar suster como pode o avanço avassalador da Alemanha no domínio da moeda única europeia, mas acontece que o apetite germânico é insaciável e os franceses, que até já provaram duas vezes da receita com os resultados que se conhecem, parece finalmente terem percebido serem não comensais mas, também eles, o próprio jantar! A Grécia já marchou, muitos outros, como Portugal, esperam a tremer espetados no garfo, outros ainda deixar-se-ão deglutir com todo o gosto, está-lhes, ou talvez melhor dizendo, são do mesmo sangue. Sobram os do costume, a incauta França, é que o tal eixo acabou-se, o famigerado Reino Unido que, também como é habitual, deixou ficar um pé de fora porque o teve sempre atrás, e claro, os restantes interessados, num mundo global sempre mais e mais pequeno. Haja esperança, mas como tão bem o comprova o discurso do sô Shaubel, como diz o cromo do Marcelo, não parece que a Alemanha vá parar enquanto não lhe forem todos comer à mão. A Grécia sabe-lhes a pouco...