Numa análise forçosamente simplista digamos que o eleitorado maioritário de um país sofrerá de uma evolução de o levará de um estado de quase completa crença dos salvadores fruto de muita ignorância, passando para um outro intermédio onde começam a aparecer franjas crescentemente importantes a pôr em dúvida as ideias que lhe são vendidas sob forma de promessas, a finalmente uma situação na qual a maioria pura e simplesmente deixa de acreditar no discurso político não obstante também este ter vindo a refinar-se na arte de mentir ao longo do processo bem como, deve-se reconhecê-lo, ele próprio benefeciar de um incremento na procura do intelectualmente honesto. A esta última fase corresponde, como é óbvio, a circunstância de um forte aumento na abstenção.
Este fenómeno é fácilmente verificável nas suas várias vertentes se se pensar nas práticas em países do terceiro mundo, no nosso, de alguns dos nossos vizinhos mais desenvolvidos, e até, já nos antípodas da ignorância, nas sociedades mais esclarecidas, onde se verifica um retorno ao ato cívico do voto por se reconhecer que quem vai governar o fará de forma digna e correta, como acontece em alguns dos países nórdicos.
Por cá, às portas de eleições, é confrangedor verificar que ao fim de mais de quarenta anos de liberdade objetiva, se continua a assistir a um discurso partidário, incluindo aqui quem está no poder, que sufoca pela incredulidade de como é possível os que mandam e os que querem vir a mandar, continuarem a desconsiderar tão descaradamente a massa votante. Logo à partida aquele que deveria estar acima de qualquer suspeita dá o mote não demonstrando imparcialidade, o que podendo parecer normal é muito importante porque se perde uma referência que se não objetiva, pelo menos psicológicamente tem a vantagem de passar a sensação de que, nem que seja no limite, a justiça existe. Depois os tristissímos e sempre repetidos exemplos de uma parte afirmar uma coisa, e a outra o seu rigoroso contrário, o que conduz à inevitável descredibilização. É realmente incrível que precisamente quando deveria imperar o bom senso do equilíbrio, no justo e sincero apresentar de propostas ao eleitorado, é quando se assiste à maior radicalização, para depois no exercicío da governação, durante a qual efetivamente se deveria gerir com determinação ao aplicar o proposto, se entra numa espécie de águas turvas para que possa imperar a mediocridade.
Claro que sempre se poderá dizer que é dessa dialética que o povo, sistemáticamente dito sábio..., vai tirar as suas supostas justas conclusões, de forma que dessa fervente caldeirada sempre emergirá a lula certa. Simplesmente para isso era preciso que o tão maltratado eleitorado tivesse a preparação necessária, que manifestamente não tem. Quando como ainda ontem se assiste ao governo falar em 12% de taxa de desemprego e o PS em 25%, o que acontece é uma de duas coisas, ou, como acredito desgraçadamente se passa, grande parte das pessoas vão votar com espírito bairrista ou, ainda pior, clubísta, não tendo em mente um qualquer projeto de vida, ou então restam as minorias, umas menos minorias que as outras como é o caso dos que nem põe os pés nas assembleias de voto, e os que, entre os quais tristemente me incluo, optam por comparecer por uma razão algures entre uma sensação do cumprimento da obrigação de dever cívico, não se criar o perigoso vazio de poder, e a miserável escolha do mal menor.