À ideia de que à mulher de César não chega ser séria, também tem que o parecer, está ligado um conceito de respeito pelas aparências, por aquilo que estas têm de importante numa figura tão relevante como a companheira de um imperador, no sentido de que também ela devem funcionar como bom exemplo, logo estar acima de qualquer dúvida quanto à nobreza do seu caráter. Infelizmente, e também fatalmente, porque como em tudo o resto há também o outro lado, a outra interpretação possível e, provávelmente, aquela que mais de acordo está com a atitude, no seu sentido metafóricamente mais lato, da larga maioria das mulheres dos césares desta vida, o da subserviência e medo e, se se quiser levar a metáfora ainda mais longe abrangendo a sociedade em geral, do lacaiísmo e da inveja.
É sabido o peso histórico que uma atitude passiva, morna, tantas vezes compensada por uma espécie de vivência mafiosa, disfarçada pela forma quase doce por tão dissimulada como é praticada, tem em Portugal. Consubstânciada pela sornice songa de constantemente se estar ao lado de quem, naquele momento, está por cima, não hesitando em servir da máscara de ferro ou homem de mão, como se diz, a todo aquele com poder para comprar quem aceita ser comprado. Hoje, como ontem, desde sempre e se calhar no futuro, é só olhar para o lado no escritório ou na oficina, para o vizinho ou familiar, para imediatamente o constatar. Problema endémico e verdadeiro causador de todos os atrasos de inumeros países que, como o nosso, sofrem dessa espécie de doença aparentemente incurável.
Os principais inimigos deste estado das coisas são todos aqueles que, remando contra a maré, tentam contrariar com o seu próprio exemplo, este tipo de postura perante a vida. Salvo algumas honrosas exceções, rápidamente são atacados por todos os lados, remetidos a um isolamento, temerosos e envergonhados, olhados de lado, duas hipóteses lhes resta, ou alinhar na paz podre da mediocridade, caminho seguido pela larga maioria, ou serem para sempre ostracizados por todos. É do conhecimento geral o crescente numero de pessoas que desde há imenso tempo, sentindo a opressão deste status quo, conhecedoras das suas capacidades, abandonam o país para no exterior darem largas aos seus talentos, por lá acarinhados e admirados enquanto, por cá, numa triste confirmação da epidémica inveja, palavra com que Camões, concerteza não inocentemente, termina os Lusíadas, são olimpica e serôdiamente ignorados.
Algumas instituições tentam revoltar-se recorrendo a tudo para sobreviver, o quanto possível digna e livremente, no meio desta autêntica camisa de forças. Por vezes utilizando as mesmas armas que se no poder reinante são legítimas ou ardilosamente escondidas, quando o são por elas logo se tornam ilegais servindo para a tentativa de as sufocar por todos os meios, e são quase todos, ao alcance de quem domina a situação. Um desses casos é o FC do Porto que, durante décadas, contra tudo e contra todos, lutou enérgicamente e tornou-se um clube mundialmente conhecido e admirado enquanto, por cá, continua a ser sistemáticamente perseguido. Como sempre, os árbitros, supostos juízes acima de qualquer suspeita, estão ao serviço de quem distribui o bodo aos pobres, neste caso de espírito. Imbuídos de um falso sentido de justiça, armam-se em mulheres de César para tentarem demonstrar ser sérios quando, na verdade, só logram parecê-lo afastando-se de um suposto malfeitor, artificial e meticulosamente fabricado pelo poder instalado ao longo dos anos para, pelo medo, tentar manter a posição dominante. Como de costume não vai chegar ser o melhor, vai ser preciso ser muito melhor e, quem sabe, até algo mais. Depois que não se queixem, ou, por falar em César, em Roma sê romano!