Realismo mágico, enquanto escola literária sul americana, e a magia feita realidade são conceitos diferentes, complementares, normalmente, onde um acaba o outro começa.
Como é sistematicamente sensível nos livros daquele que é o mais conhecido rosto do Realismo Mágico, Gabriel Garcia Marquez, este estilo como que convoca um novo fôlego para a vida. Os velhos de GGM no Outono do Patriarca, Amor em Tempo de Cólera e o inesquecível José Arcádio Buendia, em Cem Anos de Solidão, entre tantos outros são disso prova. Em A Memória das Minhas Putas Tristes, este autor chega a demonstrar que é a partir dos 50/60 anos, uma vez ultrapassados todos os medos e escapado às doenças que normalmente, quando aparecem, é nessas idades, que a vida realmente começa. Um caminho feito da realidade crua e nua que é a vida, para um outro, com um certo misticismo redentor, salvador. Aqui menos religioso do que é, por exemplo, entre os velhos da Europa, mas recorrendo mais à liberdade das ideias, da fantasia, onde o tempo e a imaginação não têm limites. Uma transposição, nem sempre suave, para o mundo dos sonhos, é a experiência que Gabriel Garcia Marquez nos proporciona. Viagens alucinantes.
Para ilustrar o outro conceito, magia real, parece-me ser Mário Vargas Llosa o escritor mais adequado. Neste caso o caminho é feito por crianças, jovens e homens novos, alguém que, pela sua idade, ainda vive dentro de um mundo mais, ou menos, ilusório, ainda mágico, do qual o autor vai (nos) levando pela mão, fazendo essa quase sempre dolorosa, traumática passagem, para a dita vida real. Em livros como Conversas na Catedral, politicamente, em Tia Júlia e o Escritor, sexualmente, ou nos Cadernos de Dom Rigoberto, no amadurecimento, podemos constatar essa metamorfose. A nostalgia presente nas obras de GGM dá lugar a uma certa esperança no futuro. Ou, pelo menos, na possibilidade de o construir pos si próprio. Escritor profundamente interessado na politica, como o demonstra nas Conversas... e no fantástico A Festa do Chibo, verdadeiro paradigma da "republica das bananas", mas também capaz de transmitir sensualidade a niveis deliciosamente perturbantes como na Tia Júlia ou nos Cadernos de Dom Rigoberto.
Navegando nestas águas impossível ignorar o homem que misturava e baralhava, no mesmo texto, magia e realismo nos seus estados mais puros. Roberto Bolano, caso tivesse durado, provávelmente seria tão ou mais lido que os "monstros" atrás referidos. E daí...talvez não. Se calhar o que conduziu a pena de tão espantoso escritor, só seja sensível quando se sabe com os dias contados, nada a perder, já a sentir a arajem e o reflexo do que lá vem.